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quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Só mais um José – Gilberto P Reis

Só mais um José – Gilberto P Reis

João fora uma criança tímida, nascera, vivera e criou-se numa fazenda num rincão do centro-oeste mineiro. Filho único. Não tinha crianças a menos de 3 léguas, brincava só. Era uma criança apática. Seu pai passava o dia no roçado e cuidando do gado, sua mãe era uma mulher tão apática quanto ele, casara-se nova, ainda adolescente, portanto não sabia lidar com filho.

Seu nome é João Felício Bandeira Perazzo.

João tornara-se garoto soberbo. Sem amigos, mas feliz. Fora à escola, cultivando extrema inteligência. Não conhecia garotas, conhecer conhecia, mas apesar de ser um jovem belo, ocupava seu tempo escrevendo enquanto observava a vida da fazenda pela janela do quarto.

Seu pai prosperara, então contratara alguns peões para auxiliá-lo no trabalho da fazenda. Pedia ao filho que apenas estudasse. Que se tornasse doutor pra que não precisasse calejar no roçado.

João então estudava, mas divertia-se vez e outra, juntos aos peões na ordenha e correndo pasto atrás de novilha desgarrada.

João no colegial, sendo a escola longe demais pra caminhada, seu pai lhe presenteia uma motocicleta pra que fosse estudar. Torna-se exímio piloto. Vez e outra viam João cortando os morros da fazenda perturbando gado, estes corriam feitos loucos ladeira acima e abaixo, correndo da máquina de barulho infernal. Seu pai ficava enlouquecido, mas ao mesmo tempo ria com felicidade que só pai tem ao ver filho feliz.

Sua mãe continuava apática. Vendo novelas à noite que chegavam pela parabólica e num canto qualquer da casa durante o dia tecendo ou bordando.

Na escola as garotas gostavam do João, mas ele não gostava das meninas do lugar. Sempre alguma pedia pra andar na sua garupa, mas ele dizia ser perigoso, que não poderia arriscar machucar ninguém. Desculpa. Nesse tempo João já moço, andava com uma turma de garotos de sua idade, mas não tinha nenhum amigo especial, eram apenas amigos.

Certo dia voltando pra casa, encontra João uma colega da escola caminhando sozinha pela estrada poeirenta, cercada por relva de cerrado seca por falta de chuva, ele passa devagar, e é quando pára a pedido dela. Uma jovem com seus 16 anos, loira como a maioria daquele lugar, como um corpo esguio e pés no chão. João pergunta pra onde ela vai. Ela diz que está indo à cachoeira que tem por perto encontrar uns amigos. Ele então oferecera-lhe uma carona. Ela retruca, afinal não é ele que sempre negou uma garupa por ser perigoso? Mas ele diz que iria devagar. Ela ri e sobe a garupa. João segue até a dita cachoeira, mas chegando lá não havia ninguém a espera. A jovem então desconversa e chama João pra nadar com ela. João aceitou e após despir-se, ficando apenas de bermuda, que sempre vestia por debaixo das calças, pulou na água. Quando emerge assusta-se com a garota já atrás dele, como ele a nunca viu, como nunca havia visto mulher alguma. Nua. Ele sentiu um medo excitante, João, que nunca havia sequer beijado, que o mais perto que havia chegado do sexo fora nas revistas pra adultos, encontradas no alojamento dos peões, e sonhando, dormindo ou acordado, e que ruborizava sempre que seu sexo avultava, avolumando sua sunga. Ela então abraça a João, que sente seus pequenos seios rijos roçando seu peito, aquilo o enche de prazer, mas João sente medo, um medo desconhecido, queria recuar, mas a garota então o beija. O beijo, arma vital, se não fatal, faz João tremer e se libertar, ali se perde, transição que se esvai nas águas que os banham.

João gostava de escrever, e escrevia. Um semestre separava o termino do colegial e o descobrimento do amor sexual. João escrevera um livro: contos e romances. Aos 17 anos já era escritor com livro publicado. Seu pai queria que ele se tornasse doutor de ciências jurídicas, João iria pra capital se tornar doutor na ciência dos sonhos, melhor, de palavras que fazem sonhar. João graduaria comunicação na universidade federal.

João queria ser escritor, seu pai sonhava outros sonhos, mas como o bom pai que era apoiava João. Sempre feliz, alugou uma casa pequena pra João na capital, junto de sua mãe seu pai trouxe João a cidade, mostrou a João os perigos desta, pagou a uma senhora pra cuidar de João por uns tempos até que este aprendesse a se virar sozinho e a pediu que mostrasse a João os caminhos da cidade. O pai de João se despede, a mãe chora, pela primeira vez João vê sua mãe chorando, e então seu pai chora, João chora.

João estava na cidade grande agora, já havia estado uma vez, mas muito menino, não se lembra direito. João tinha casa, comida, dinheiro, mas agora ele tinha uma coisa a mais: solidão. João não tem mais moto, poeira, gado, a fazenda, inspiração.
João vai à escola. Conhece o campus, conhece o mundo. Faz amigos, conhece a noite.
Por ter obra publicada, João era célebre entre os demais. Gozava da simpatia dos professores e dos intelectuais. Começou então a gozar da simpatia das garotas. Muitas quiseram ter com ele. Garoto bonito, abastado, inteligente. Sua casa então conheceu muitas personalidades, nada notórias. Dispensou a senhora que cuidava da ordem das coisas, dos afazeres domésticos. Muitas mulheres o visitavam. Usava, era usado. Apaixonava-se, fazia apaixonar. O tempo passou, escreveu mais um livro, vendeu, comprou carro, emancipou.
Visitava seus pais entre os semestres, e cada vez menos sentia saudades da fazenda, mas ainda assim era inspiração pra seus contos, temas que ele mesmo desconhecia, como o amor e ódio. Era nato.
João amava muitas mulheres, de varias idades. Bastavam-nas que o procurasse pra suas audiências vespertinas. Em geral diziam procurar um reforço acadêmico, sendo João rapaz tão inteligente e dedicado, podia-as ser útil. Era decerto útil lhes em varias matérias.
João numa dessas tardes conheceu Ana Luísa em livraria conhecida. Ela pediu autógrafo, João deu.
Depois comprou casa nova no Aeroporto, aonde não mais cedia audiências vespertinas. Pois seu pai disse que homem tem que ser respeitoso e honrado quando chega o momento. De veraneio na fazenda com os amigos, lá mesmo Ana Luísa pejou.
Meses depois João casou. Nasceu então Felícia, sua felicidade e eterna inspiração.


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