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domingo, 26 de outubro de 2008

O MAL NÃO CAUSA MAIS ESPANTO - G. P. Reis

O MAL NÃO CAUSA MAIS ESPANTO
Ao paraíso que vós esperais, porque a Terra é uma grande privada celestial.
Continuadamente faço críticas às convenções sociais contemporâneas. Repasso meus argumentos a poucos alguns, se todos lêem não sei, e se reflexionam, menos, mas o que me importa é o caminho, a reflexão, a intenção da idéias, pois tenho fé que não tardará a prática, a exposição do eu e do fazer, em deposição do outro e do observar.
Contemplamos no século passado de um impressionante avanço técnico científico, um salto milenar graças às guerras e exploração não sustentável, mas em revés, estatui dia após dia o detrimento social. Desde que tenho consciência de mim e do mundo, não somava tanta perversão humana quanto a que acomete na última década e prossegue. E não sou sequer de longe um apocalíptico, mas ser mal pelo visto é regra e bondade é exceção. A banalização da maldade é comum em discussão de muitos happy hours. Roubar, matar e etecetera diante às câmeras de segurança ou da Globo é cool, “de pagar pau”. Eu digo que é decadência. Estranhamente eu digo, relativamente aos criminosos atuais, com poucas exceções, os bandidos de 40 e mais anos atrás são dignos de respeito, porque respeitavam as comunidades, embora não deixassem de atentar contra ela. Entretanto, os fatos são outros, devido o domínio do crime pela juventude, e atualmente bandido não respeita, e seus atentados são cada vez mais vis, como que quanto maior a crueldade, maior a sensação de poder. Tenho uma profunda ojeriza por criminalidade e criminosos, independente do número e grau, e posso viver em uma sociedade tomada por eles? Sim, posso. Mas o que não posso é aceitar a desconstituição do Direito e da liberdade. A Carta dos Direitos Humanos fora escrita afim de proteger bandidos? Decerto que não, fora escrita para proteger cidadãos de bem para que estes não sofram abusos por parte dos criminosos. E como estatisticamente é bandido que cai nas garras da polícia, ironicamente são estes que mais usam deste direito, porque infelizmente para ser o mínimo justa, a Lei deve ser comum. Mas não é estranho que o indivíduo que mais desrespeita determinada lei seja invariavelmente amparado pela mesma? Também tenho ojeriza de Direitos Humanos, porque sei que ela está aí, regula, e estará pronta para justiçar a meu favor acaso eu sofra qualquer atentado, mas ela não estará aí quando acaso eu estiver sofrendo o atentado, e o meu algoz sorverá de todos os benefícios da lei. Este argumento poderá levantar uma provável tese de que renego todas as leis, já que visto a capacidade humana para o mal e a desobediência, nenhuma regula, e sim, efetivamente coage à pena pós-fato consumado. Mas é que tenho uma leve tendência à reciprocidade, mas infelizmente, ainda que fosse de comum senso entre a sociedade, seria um grande desafio para o campo jurídico praticar tal segmento. Como aplicar pena igual à aflição produzida pelo réu à vítima?
O caso dos Denunciantes Invejosos ¹. Somado às minhas convicções morais e éticas, este caso, complexo, exposto no curso de Direito, me fez duvidar se quero mesmo seguir essa carreira. Observando os colegas em um júri simulado, percebi que alguns brilhantemente incorporaram fatalmente o caso, e observei principalmente a convicção daqueles que faziam a defesa, utilizaram repetidamente da palavra Lei, tanto em seu sentido estrito como léxico. Como integrante do júri, votei pela condenação dos réus e expus minha tese, mesmo que brevemente, pois a mim não são necessários longos discursos para qualificar minhas convicções. O homem ao longo das eras lapida a Ética, a partir da Ética cria o Direito, e ao longo das eras o homem desvirtua o Direito da Ética e o presta a Letra. O Direito segue os preceitos da Lei, e concomitantemente segue os preceitos da Moral e Ética. Mas em nenhum momento, tanto da defesa quanto da acusação, ouvi menção disto. Falou-se sobre respeito à Lei, à Constituição estatutária e até mesmo sobre sentimento de compaixão, mas não de Moral e Ética. Defendeu-se o medo de um regime autoritário, a obediência às leis vigentes. Como defender ações de valor moral execrável apoiando-se nesses argumentos? Devo eu condenar um cidadão injustamente apenas porque a legislação me chantageia, corrompe ou ordena? Devo eu defender um assassino confesso e de culpabilidade inegável? Se as respostas forem sim, não presto para o Direito. Lei é letra, e letra é mutável, Moral e Ética é lógica, e não se dá ao desfrute. Eu sou a liberdade, e nenhum sistema me tomará disto, e nenhuma chantagem, corrupção, ameaça ou medo me fará desistir da fé em mim mesmo ². Posso usar de vários argumentos infalíveis para absolver um carrasco, mas nunca mentirei para mim, e agradeço a impossibilidade de tal ensejo.
A sensibilidade para o mal se perdeu com a expectativa do capítulo intrigante da novela das oito. A sociedade acostumou a esquecer as notícias de abusos e aflições relatadas nos telejornais noturnos logo que surge o galã na chamada da novela. Sites de conteúdo fúnebre, que divulgam cenas de torturas, assassinatos e execuções sumárias são vistos por jovens com torpor. O índice de violência contra mulheres e crianças é assustadoramente crescente. Há quem diga: “peraí, desde sempre mulheres são mortas ou agredidas pelos homens, em certos países faz até parte da cultura, por exemplo na Índia”. Mas retruco dizendo que essa “cultura” nunca foi apoiada pela Ética, e sim pelas leis, e atualmente nem as leis apóiam tais atrocidades. Essa necessidade de poder sobre o outro, de domínio, de imposição de vontades, é sim, um mal. Atuar como se eu tivesse direito sobre a vontade do outro e até mesmo sobre sua vida deve no mínimo render o direito à precedência, dando direito a outrem para que aja sobre mim de mesma forma. O recente caso “Eloá” serve como luva à minha tese, - pois findado, e com fracasso o caso, nenhuma outra serventia terá senão para estudos e estatística – como reservar o direito à vida a um delinqüente que oferece desde a primeira hora do incidente risco iminente aos reféns? Um policial dito comandante perdeu a LIBERDADE de ação por MEDO da reação popular quanto a um possível abatimento de um criminoso, um policial experiente, que junto a seus subordinados, recebem um salário incompatível com função que exercem, e que para treinarem e se capacitarem para atuar em casos semelhantes precisam pagar do próprio bolso tais treinamentos porque o estado é negligente, o mesmo estado que tanto orgulhamos ao dizer que somos NÓS. O criminoso atira contra vários cidadãos na rua, diante câmeras e fuzis da polícia, e ainda assim é um pobre coitado de coração partido. Já ouvi falar de muitos que foram executados pela polícia por menos. Dá próxima vez que eu tomar um pé na bunda sairei atirando ao léu, gritando “é nóis”, enrolado pela bandeira do cruzeiro. E pode até ser sarcasmo de minha parte solicitar isto, mas depois do fatídico incidente com esse cidadão Lindemberg, alguns outros cidadãos de direito pleno resolveram copiar. Seria epidemia de pés na bunda e machos contrariados ou a mídia explorando a oportunidade? Esta resposta não tenho, não tenho respostas para muitas das minhas perguntas, mas é certo que sei que sempre questionarei qualquer ato ou fato que EU julgue errado.
O mal cada dia mais maligno, o que pode parecer estranho é possível, todos temos um desejo, tanto para a bondade quanto para maldade. Desejamos abrir o portão para que o poodle da vizinha fuja e se perca na rua, para que nunca mais nos acorde com seus latidos na madrugada. Desejamos dar uns trocados para o garoto do sinal mas ele irá comprar cola com o dinheiro, então... Mas também não queremos que a filha da vizinha chore a perda do bichinho querido, mas eu não sei que a menina espanca o pobre e finge que gosta dele, e não sei, mas o garoto do farol vai apanhar do padrasto por chegar em casa sem os trocados que daríamos. Acredito que o bem e o mal se balanceiam, e por eu ser individualista, não vejo porque praticar mais a um ou outro, ou sequer os dois. Sei que posso ser bondoso, mas não aceito a recompensa que tantos se orgulham por isso, pois, como se orgulhar por ser bondoso enquanto renega o orgulho de alguém que se julga mal. Sei que posso ser mal, mas não desejo algo que não suportaria a mim mesmo. E pela minha aversão à maldade, pode parecer que sou defensor radical da bondade, mas a questão maldade ainda é mais impactante que a bondade, a razão de sua relevância. Em outro argumento tratarei do assunto, e também que um ato de bondade pode não ser tão bom assim. Enfim, recuso a compaixão ou ódio alheio, porque sou capaz de criar meu próprio azar, pois a Ética não é a verdade, e sim equilíbrio, e posso até evitar o orgulho, mas tenho como grande prazer a racionalidade.
¹ O caso do Denunciantes Invejosos. DIMOULIS, Dimitri – 2005. Ed. Revista dos Tribunais.
Original da edição The Morality Law, p. 245 a 253. Lon L. Fuller. 1969. Yale University Press.
² V for Vendetta. WACHOWSKI, The Brothers. MacTEIGUE, James. Vertigo/DC comics. 2005. Warner Bros Pictures.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

O capitalismo não poupa ninguém - Gilberto P. Reis

O capitalismo não poupa ninguém

Neste inicio de século, confesso que esperava por uma grande guerra internacional, ou uma avalancha de catástrofes naturais, ou até mesmo pelo fim-do-mundo nostradâmico. Mas não uma crise de proporção como a que nos anunciam.
A minha primeira crise fora em minha adolescência, melhor dizendo, a primeira crise econômica que vivenciei racionalmente. A crise asiática. A época se torna aparentemente distante devido ao furor econômico que se seguiu, com o notável crescimento econômico refletido no aumento de postos de trabalho, e conseqüentemente, no poder de compra e PIB nacional. E embora eu tenha sofrido com a inflação na era cruzado→cruzeiro-novo; principalmente pelo estresse diário de minha mãe, promovido pelo salário que nunca chegava a 2ª semana do mês; ainda não sabia que dois mais dois na economia não eram quatro, ou seja, justamente pela minha idade, consciência político-econômica zero.
A crise asiática, assim como a atual e a recessão de 20, economicamente dizendo, resumem no seguinte: Deus no céu, CEO´s na Terra. Estes alto-executivos decidem pelo o que fazer com o dinheiro alheio de forma escusa, e pouquíssimas vezes são fiscalizados pelos Poderes elegidos por nós. E quando a casa cai, ou, desculpem o trocadilho, quebra, estes mesmos elegidos decidem, por nós, tomar por empréstimo o “nosso dinheiro” para tapar buracos, a receber não sei quando. E resigno-me quanto a isto, pois sem devidas atitudes, o buraco de hoje virá a ser cratera amanhã. Muitas fortunas esvaem numa crise desta proporção, muitos se vêem à beira da falência, mas é fantasiar demais dizer que alguns deles chegaram à pobreza. Quem sofre agruras é a mãe de família, o porteiro do prédio, a atendente do banco, a gerente da padaria, em suma, quem trabalha. Integrity Bank, Merril Linch, entre outros, que antes ditavam as regras e diziam aonde e em quem deveriam os especuladores investir seu rico dinheiro, estes mesmos que não se condoíam ao classificar o Brasil país com grau elevadíssimo de risco para investimento, eles sabiam o que falavam, e o faziam, eles sabem tudo, agora, doravante, na lona. Já ouvia de minha avó: primeiro ordene sua casa. É a hipocrisia do mercado. Quer algo mais hipócrita que o Capitalismo? O Socialismo, o Comunismo, o Stalinismo, o Maoísmo, o...
É chocante assistir a imagens como a de funcionários do Lehman Brothers carregando suas caixas de papelão marrom pela rua, e os otimistas ainda proferem que outros cairão. Trabalhar num grande banco, ter um cargo administrativo inferior com remuneração de U$70.000,00 anuais não era de todo ruim. Ficar desempregado não é um grande problema, não conseguir uma recolocação sim. Aproximadamente 4.000 candidatos a nenhuma vaga prevista. Isso é crise, o desemprego, pois é no trabalho que o Homem encontra a dignidade, e talvez até a exerça.
Ainda não sentimos o toque desta crise, um pouco pela estabilidade dos últimos anos, um pouco pela lógica econômica: tarda, mas não falha. Se as medidas de contenção demoram a surtir efeito, os efeitos de uma crise demoram ainda mais. Lendo a coluna do ex-CEO do BC Gustavo Franco fico impressionado com sua tese de que não passa de mera especulação esse alarde de recessão americana e até mesmo mundial, com minhas palavras, diz ele, que o barco já deveria ter afundado. Ele não deve se lembrar que a recessão americana de 20/30 no século passado durou aproximadamente 5 anos, e não fora como a rosa de Hiroshima, de efeito imediato. Portanto, ao contrário de dizer, assim como um presidente que muda o discurso, para não nos preocuparmos com uma proveniente crise, acho melhor nos mantermos de esguelha para evitar surpresas. Nada de pânico, lógico. Mas o seguro morre de velho e carrega consigo todas as suas economias. Mas quem sou para contradizer um economista e um presidente? Fala-se em criar uma comissão internacional permanente para fiscalizar e identificar possíveis situações de risco no mercado internacional. Idéia do Meirelles. Desde quando o Brasil dá palpite no mercado internacional? Desde quando sabemos de alguma coisa a respeito. Me diga qual instituição deixará de investir em papéis de risco, são altamente lucrativos, e mercado é isso, arriscar. No jogo, ganhar é sorte, perder é conseqüência, eficiência é acaso.
O que sei de economia é: tudo que sobe desce. Se deixar o registro do gás aberto, com certeza o hélio fará o balão subir, mas quanto mais cheio maior a chance do balão estourar. E se alguém ainda acha que “não temos nada com isso, é burrice daqueles americanos, eles que se virem”, digo que até teríamos razão, se estivéssemos em 1930. Mas como estamos fazendo economias ansiosos para adquirir o tão esperado IPhone, que por aqui chega monopolizado, segregado de nós, os usuários pré-pagantes, e com um preço risível. Digo: temos tudo com isso!
E sorriam diante às notícias nos jornais. Impérios caem, e o Sol não está nem aí, cumpre suas 12 horas e se manda. É assim e até não sei quando: é preciso o sacrifício da lagarta para o refestelar da borboleta.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

O poder do voto

O poder do voto
por Gilberto Paixão Reis

Já fui um entusiasta quanto a exercer o direito (?) de votar, mas assim como “já fui” já foi, tratar como direito o sufrágio também não procede, pois mesmo que não sejamos obrigados a votar em alguém, devido o artifício dos ‘brancos e nulos’, o que não é facultativo está mais para dever, ou obrigação propriamente dito. Mas que seja obrigatório. Antes uns e outros omissos, a deixar que poucos coloquem suas ambições à frente da maioria, ou alguém ainda acha, que os parlamentares que brigam pela lei do voto facultativo estão mesmo preocupados com o descanso nosso do enfadonho domingo de outubro? Bom, e digo também que obrigatório de fato não é, porque sendo lei sem coerção contundente, logo não surte efeito. Mas para a cultura nacional, até que esta questão de votar por medo de restrições funciona. Eu não voto, pronto, falei. Tenho outras formas mais interessantes de atuar minha civilidade. E antes a redução da maioridade penal que a “desobrigação” do voto.
E qual o porquê desta atitude? É que cansei de políticos e politicagem, alguns diriam: “mas nem todos são corruptos, imorais”, blábláblá. Eu estou completamente radical quanto a isso, para mim, todos são farinha do mesmo saco. Tomei uma antipatia sem precedentes por qualquer candidato a qual cargo for. Mas estive do outro lado, certa vez me candidatei e me elegeram vice-diretor de uma escola estadual na cidade de Mariana – MG, na qual eu lecionava biologia, os demais candidatos, com eram tradicionais na instituição, fizeram e suaram para embargar a posse, devido regulamentos que não vem ao caso, e apesar do deferimento da SRE, conseguiram, pois eu desisti de trabalhar em meio de tanta mediocridade. O diretor da época, se estiver lá, provavelmente está comendo o pão que o diabo amassou, o mesmo que queria dividir comigo. Um amigo certa vez me convidou para candidatar a vereador – “para preencher a chapa”-. Agora outro amigo é candidato a vice-prefeito em minha cidade natal, me pediu apoio, até ofereço meu apoio, moral, mas exijo o controle de uma secretaria insignificante qualquer. Na política é assim, toma lá dá cá. Mas como meu apoio de pouco a nada vale e não despenderei tempo e dinheiro para me deslocar até lá, posso esquecer a secretaria. E já falei que as chances da chapa dele são mínimas? Então registrem.
Mas vamos às críticas diretas. Até me agrada assistir o horário eleitoral gratuito, é tanta gente ridícula, despreparada e mal-intencionada que eu até acabo por sentir-me bem por ser eu mesmo. Dispondo de jargões, “jingles”, e slogans de causar náuseas, sofríveis, que qualquer estudante mediano de marketing ou publicidade se contorce ao assistir, os candidatos usam de uma criatividade de chorar e rir . E pelamordedeus, esse papo furado de jovens candidatos que a juventude, as novas idéias e afins que resolverão já cansaram, não colam mais, a juventude atual já deixou a desejar há muito. A maioria destes jovens são os primeiros a se corromperem. Os partidos de extrema esquerda, com suas idéias revolucionárias e milagrosas não passam de bicho-papão para adultos. É greve aqui, paralisação acolá. Meu negócio é trabalho, se bem remunerado, eu quero é serviço no lombo, principalmente no alheio. Pensam eles que dinheiro dá em árvores e que podem fazer e acontecer sem levar a economia à bancarrota. Temos políticos que não podem mas pensam que podem e políticos que podem mas não fazem, em suma. Em Belo Horizonte, se alguns candidatos tiverem a certeza do que podem e não podem, com o andar da carruagem, a eleição para prefeito ainda vai dar o que falar. Mas em se tratando de política, os palhaços sempre estão na arquibancada, então deixe o circo pegar fogo.
E falam e falam da democracia que envolve as eleições, mas eu não observo esta mesma democracia no horário político. O único fato relevante que observo é que: o partido que tem mais dinheiro e tradição tem mais tempo para discursar. A bem da verdade estou longe de saber quais são os critérios utilizados na distribuição do tempo entre os candidatos, e pouco me interessa, mas de qualquer forma, seguem uma norma ou lei, que para mim tende a não ser clara, se é clara não é justa, e se é justa decerto não me convencerá. Um dos candidatos da capital mineira está bufando por ter sido excluído de debates dos principais meios de comunicação. E digo: com razão. Para a mídia, político fraco é igual a filme do Godard, não dá ibope. E se der, só se for devido a um quebra-pau, o que raramente acontece atualmente. A mídia oculta a verdade em maioria das situações. “Candidato fulano de tal não comparece ao debate”. Mentira. O sujeito não foi convidado, decerto barrado, no mínimo. E tento imaginar de onde vem inspiração para apelidos e pseudônimos tão toscos, que favorecem quadrinhas tão toscas quanto. A utilização de melodias e músicas de celebridades do momento, favorece bandas e artistas sem futuro com jingles e suas letras bizarras. Se não me engano, plágio é tão crime quanto pirataria. Cadê o Ecad? Um sujeito que não tem menor noção de lei ou a ignora, não será escolhido por mim para criar novas. Amiguinhos de jogatinas, projetos particulares, politicagens já há muito esquecidos, agora se engalfinham no horário nobre. Todos os dias, vejo notícias de candidatos envolvidos com tráfico de drogas -as mesmas que prometem combater-, pedofilia e sedução de menores, corrupção e calote. Sabiam que o irmão, e também suspeito, daquele plantador de feijão que mandou assassinar fiscais do Ministério do Trabalho acabou sendo eleito prefeito de sua cidade? Sabiam mas esquecerem, não se preocupem, acontece. Pois é, esses sequazes sempre ganham eleições, e sempre esquecemos os podres deles. É por isso que amo o povo, a civilidade, a cidadania. Já ouvi de partidários divergentes se atracarem e um destes acabando por ser assassinado. Pior do que brigar por política, é brigar por futebol. Deus me livre! Eu até que gostaria de ser político, o troco é bom, o trabalho é pouco. Mas não suporto aparecer. E pior, não tenho apelido, e meu nome não serve para quadrinhas. Um colunista aqui de BH, em sua coluna num diário marrom, demonstrou que seu nome lhe renderia um bom slogan: B... por b... vote no Eduardo Costa.
Mas meu nome nem pra isso me serviu. Amém. Mas pensando bem, que tal: contra a corrupção, vote Gilberto Paixão. Credo! Que tosco! Nem eu acredito nesse slogan. Não terá jeito mesmo. Amém.
Ao ler este texto, alguém dirá que sou: um crítico radical, neoliberal, reacionário talvez, ignorante, ranzinza, até mesmo anti-social. Não sou nada disso completamente, talvez um pouco de algum destes, confiem. Mas confesso que ando estressado ultimamente, tão estressado, que acabaria por espancar uma urna eletrônica, simplesmente por ela emitir aquele sonoro irritante do botão CONFIRMA.


PS: como já disse, não votarei nesta eleição, não sei na próxima, mas não sigam meu exemplo, vão e votem, por mim, exijam seus direitos cívicos – e juro que não estou escarnecendo neste pós-, só façam esse grande favor para um cidadão que trabalha e estuda durante toda a semana, e que não está nem um pouco afim de pegar fila para simplesmente anular voto. .

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Nova canção para álbum de moça - Gilberto P. Reis

Boa noite! Dizem meus olhos
Se pudessem, bom dia, ah, como diriam.
Mas dizem boa noite.
Pois se escondem no clarão do dia.

Boa noite digo à moça
Porém boa-noite é a despedida.
Bons-dias! Digo por alegria,
na recepção do dia.
Mas a moça não responde,
pelo cansaço de seu dia.
Boa noite: mesmo em cama fria.
Existe boa-noite em cama vazia?
Boa noite diz meu coração,
meus coturnos descansam,
em algum canto, descanse
minha boa-noite então.

Boa noite! Mas a moça não repetia.
Não se despedia no boa-noite de
um dia. Despede-se num boa-noite mulher,
pois cerrarás os olhos e parte sozinha.
Mais uma noite, e cada um no seu mundo
passeando no descanso de sua fantasia.
Bom, mais um dia.

Bom-dia! Mas o café esfria
enquanto a moça dormia.
e não responde ao cuidado
de meu “bom-dia!”. Se acaso
meu boa-noite tivesse respondido,
como bastava te ver dormir esse bom dia.
Fugiu de mim um bom-dia, abracei o bom dia.

Mas meu dia acorda cedo,
me levando no bonde da vida.
E você tem na fabrica mais um dia.
Eu espero as horas correrem
para te entregar mais um boa-noite,
que mesmo que a fadiga não replique
esse meu cumprimento sereno,
entrego mais um afago à moça
que me vigora, me afasta a melancolia.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

[Do lat. Indulgente.] – segundo tom

Tanto sonhei, que quis que a realidade se acabasse
Tanto chorei, que quis que meus olhos secassem
Tanto apanhei que quis ser valente

Tanto esperei, que quis que o tempo parasse
Tanto andei, que quis que o mundo findasse
Tanto tremi, que quis ser contundente

Tanto gritei, que quis que minha voz calasse
Tanto ouvi, que quis que a dor cessasse
Tanto de tudo, que quis nem corpo nem mente

Nesse querer nada adiantou ser eu mesmo
Nesse querer nada resolveu ser outros
Tanto quis que esse querer é tormento

Querer.
Querer isso querer aquilo
Querer a infância das mãos dadas
Querer a maturidade das façanhas
Querer o campo verde todo o ano
Querer o céu azul todo fim de semana

Eu quero...
Eu quero não querer a loucura
Eu quero não querer a solidão
Eu quero não querer a cegueira da bravura
Eu quero não querer compaixão
Eu quero não querer que...

Tanto quis que esqueci de viver.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Ainda hei de encontrar num corner escuro de minha mente insana
os versos para o poema perfeito.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

O canto dos repugnantes

Sapo-boi em noite escura
Lambe o ar asco inseto
Seborréico, oleoso olhar
Sob caspas nevadas plumas suja

Castelo de ouvidor-mor,
latrina politicalha
Vomífico back-door.

Pasmaceiros idólatras
Desmande os mandantes
Midiacráticos fanáticos dominantes
Rastejantes pagantes
Leis asnarias hipócritas

Acarídeo sois vós, diante ouro
Ouro de outrem, vagos, mortos
Incapazes, indolentes, inativos.
Acarídeo sugar-lhe-á decrépito.

Povoléu dessentidos, aceita regurgito
Mamífero desmamado recebendo vermes
De boca a boca lambe carne

Manipulação direta
Manipulação transversa
O objeto me carregues em fios soltos
Dance Ravel
Ravina dedilhada.

Hirudíneos, sambexunga.
Burro manso em pasto seco
É ele cagarolas de clamar
toma a poeira nos olhos
E os pés no chão
Dúbio cão leproso.

Vindo poucos a morrer de fome
Sustentam sina. Que sina?
Não é sina, é poltronice!
É pêlo, suor, escarro, catarse.
É refresco, pipoca, domingo no parque.
É segunda, semáforo.
É casa, semanário, epizootia.
Cadê o pecado? O rei comeu.
Abaixo o parlamento
Abaixo a cidadania autodestrutiva
Cadê a mediocracia alternativa?
Os bigodes rançosos imperiais?

Divórcio negociável, romance contratado
Abraço de quem odeia é um despropósito.
Saliva da madrugada.
É lodo, nódoa eterna.
Nascer bonito e limpo.
Morrer feio e sujo.
Não obstante, no leito, indaga-se:
porque não se morre como se nasce?
Morre pelo pecado, vive pela ânsia.
Deixando seus pruridos para outrem carregar.
Societários, reunião de portas fechadas
Essa sala escura não guarda boa coisa.
Mas ninguém bate à porta
Espera-se pelo fim dela,
Pelo fim deles,
Pelo próprio fim.

sábado, 2 de agosto de 2008

Românicos -Vander Lee

Românticos são poucos
Românticos são loucos desvairados
Que querem ser o outro
Que pensam que o outro é o paraíso
Românticos são limpos
Românticos são lindos e pirados
Que choram com baladas
Que amam sem vergonha e sem juízo
São tipos populares
Que vivem pelos bares
E mesmo certos vão pedir perdão
E passam a noite em claro
Conhecem o gosto raro
De amar sem medo de outra desilusão
Romântico é uma espécie em extinção
Românticos são loucos
Românticos são poucos
Como eu

A TERRA DOS SAPOS FALANTES, ELEFANTES VOADORES E RATOS ARROGANTES

Na terra da fantasia, onde não há pecado, o rei dorme tranqüilo...

O que fiz para merecer estar aqui? Pelo desejo do Mestre fui enviado para este mundo, onde não interfiro, apenas coleto o máximo para o conhecimento de meus pares. Esta raça antropofágica. Decadentes são. E para viver aqui incorporei a humanidade em meus tecidos. Aproveitei de algum comum para passar desapercebido em meio a tantos interesses vãos. Mas o abduzido fui eu. Há tempos vivo neste mundo, e não posso voltar, saudades não sinto de onde vim, porque sentimentos frágeis minha raça não sente desde a revolução, desde a vinda do Mestre. Mas aqui, neste corpo, sinto todos os sentimentos desvalidos para a minha raça. Saudades, dor, medo, ódio, amor. Aqui matam, enganam, suicidam, brigam, violentam, se drogam, se tocam. E agora faço parte disto. Sangro, bebo, odeio, e amo. Crio laços com qualquer animal, característica fundamental para a sustentação da humanidade. E se eles soubessem que neste mundo eu não posso morrer? Que quando estes tecidos que carrego definharem, o Mestre providenciará outro após outro? Até que sua vontade seja feita e eu seja finalmente enviado para o aspecto vazio. Pois simplesmente neste mundo ninguém sabe quando poderá morrer, essa imprecisão que me incomoda, não saber quanto tempo tens para cumprir metas. Esse mestre que aqui chamam de Deus, que muitos veneram, age estranhamente sobre seus protegidos, se é que posso chamá-lo de protetor. O Mestre recusou a detalhar sobre Deus antes de me enviar, assim eu não poderia interferir no que rege os mundos sapientes, a fé. Esse Deus, que não explica nada, que não se mostra, que deixa seus “filhos” ao léu, com promessas de um mundo que ninguém sabe se realmente existe, e deixa o caos tomar seu mundo... Em Andiar, eu sei quando morreria, assim como deve ser, e acaso quisesse, poderia consultar o Mestre para viver mais, até efetuar as metas, ou mesmo pela própria vontade do mestre. Mas existe uma complexidade circunstancial nesses casos. Todos têm metas em Andiar, e somos criados para realizá-las, ninguém é criado ao acaso, o que aparentemente neste mundo acontece. Bilhões de animais sem metas, egoístas. Que procriam exageradamente, sem respeito à essência. E sob o olhar complacente de Deus. E nada se aprende neste mundo, não se conhecem, não conhece o outro, e por vezes acabam por se vincularem ao que chamam de inimigo, sofrendo conseqüências de grande agravo, sendo levados pelo que chamam de: coração, conotação abstrata para compaixão, sentimento abstrato, lógico. Poucas coisas são concretas neste mundo, e vivem apenas porque absorvem do que chamam de esperança, fantasiam. Mas o que esperar de um mundo onde se consideram o outro inimigo por qual causa for? Já experimentei diversas sensações, mentir foi uma delas, já que as conseqüências destas mentiras poderiam ser desastrosas, e de fato algumas foram. Causei, um desconforto emocional ao interlocutor, aparentemente danoso, e a mim um desconforto psicofísico sem precedentes. Outras experiências, no que diz respeito à relação social e física entre humanos, experimentei. Frustração sobre frustração. Observei todos os pragmatismos humanos, unicamente, meu desinteresse. A solidão e a insegurança dos humanos os levam a cobiçar situações de singular discordância com a personalidade destes, desvio de conduta natural, social e cultural. Imaginam eles que o diferente sinonimiza satisfação e até mesmo felicidade. Eu, que sou o mais diferente dos humanos, posso garantir que a felicidade não existe. Principalmente neste mundo. Ser comum é satisfatório, diferenças criam discórdia, é ideal a luz, a energia sempre branda e monocromática. Digo que ainda conservam coisas ideais, que aos poucos se perdem, a proveito do inútil. Mas posso arbitrar que, outros mundos, nada empregariam deste, por se tratar de coisa pouca.
Desculpe-me mestre, prometo que este será meu último nesse teor, os próximos serão exatamente técnicos e necessários, mas releve se eu não cumprir minha promessa, ou até mesmo minhas metas, o que se pode esperar de um humano?

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Um adeus e até amanhã

Um adeus e até amanhã


Domingo, 20 de julho. O sol se pôs preguiçoso, tímido, os arranha-céus deixaram a desejar, ocultaram aquele bucólico e melancólico crepúsculo. Mas o efeito que me proporcionara ainda era o mesmo que os das serras de Mariana. Pela marginal, silêncio. Apenas o barulho do motor, sufocado pela música que tanto me faz lembrar o que quereria esquecer, oriunda do player, e que estranhamente me tirava dali. Não teve despedida, mas bem que poderia, daquelas com diálogos e dramas hollywoodianos. E imaginei, fantasiei, fingindo para que o percorrer aquela distância não tivesse sido em vão, para que, quem sabe? Voltar outro dia. Num dia menos agitado.
Nos últimos meses evitei aborrecer a quem quer que fosse com minhas lamúrias, com esse chororô de que ninguém agüenta. Vez por outra, acabo por confessar a mim mesmo esse romance oculto, em cartas, (poesias?), que se escondem, envergonhadas, por tal marmanjo que aqui vos escreve. Mas como me habituei a escrever num teclado, não corro o risco de papeis amarelados se revelarem num dia de faxina. E deixo os escritos, guardados, sem nome, no Winchester. Sem título, provavelmente não serão encontrados, e sim, acidentalmente, serão excluídos sem a menor pena das inspirações do dito amante.
Amor. O que é isso? Dor? Fadiga dos pensamentos? Que nos arrasta a caminhos tortuosos e aparentemente íngremes? Já ouvi falar que o amor pleno está ligado quase sempre a alguma impossibilidade. A impossibilidade do abstrato faz o concreto. O amor existe, e não falo de amor fraterno, do sangue de meu sangue, que esse é in natura. E sim o da carne, do abraço, dos lábios suados. Deste apenas sorvo. O mundo me impede a doar. E se sobre isso escrevo, é porque sei que não sendo o único, nada poderá se resolver, afinal, quem já não sofreu a perder o sono, de tremer a alma, de sentir o vazio da fome? Tudo isso pelo dito amor. Poderia contar-lhes dois anos de histórias tristes, enfadonhas, a despeito disto, mas são minhas histórias, que carrego orgulhoso. Como incorporar sonhos à realidade presente? Nesses dois anos o caso se faz tão triste, que os felizes, justamente, pareceram sequer concretizar. Paixões carnavalescas, de encontro programado ou coincidente em botecos, veranistas. Sem fundamentos ou compromissos, sem mãos dadas ou promessas. Paixões simples servem apenas para manter solitários longe do suicídio. E por isso são paixões boas, de fim de semana, ou de uma noite apenas. Na boca da saudade, gosto bom por um dia.
Como tudo acaba, metade do amor acabou, sobrou a minha metade, e fiquei para trás. Rompeu como tinha de ser. Talvez o futuro se torne presente, e se sobrar alguma coisa, desembrulhamos para ver, se tiver algo para fazer graça, e se nos fizer gargalhar, será então a retomada. Mas por enquanto esse pacote ficará escondido num canto escuro do baú da memória cansada, e ocupada com sonhos mais fáceis de alcançar. Sigo em paz, assim como segue a estrada onde voa o carro, sob onde ronca o motor. Se assim é que é, assim que vai ser. E deixarei as cartas em papel reciclado para outra vez, as ferramentas modernas de comunicação on-line, isso, penso eu, agora, extermina tão rápido quanto inicia, qualquer amor possível. Sei do vazio desses relacionamentos virtuais que se acumulam, e do tempo que se perde com essas comodidades. O bom mesmo é o encontro, é a espera no saguão do aeroporto, é a despedida chorosa. E não essa instantaneidade. Já fui e agora retorno, à moda antiga. Mandar flores, escrever cartões, convite para sair à moça que acabei de conhecer, fazer todas as vontades mesmo que ela não retorne, ou que eu não retorne o telefonema. E ligar vez por outra, do velho e bom orelhão.
E sendo assim, por amor amizade não tenho. A amizade começa onde termina o interesse. Não terá cartas então, o que poderia ser divertido, como no cinema, mas perder-se-á a graça quando o destinatário é conhecido, e não corresponde. E vou, sem o último abraço ou beijo, sem a última palavra, ao menos um “seja feliz”, sem ao menos chance de dizer o que poderia ser minha última palavra. Sem satisfazer o meu último desejo por esse amor. Enfim, é o que é, se não tenho a despedida, a chance das flores, o artifício da dúvida, se não amo como quero, amo como posso. Basta-me te conhecer, a existência, sua existência. Seja feliz e boa sorte!

domingo, 27 de julho de 2008

QUEM DIRÁ?

Quantos anos se passaram?
Quantas pedras se desfizeram?
E esse barulho não passa.
Quantos sonhos acabaram?
Quantas vezes despertaram?
E você não está.

Quantos dias passarão até você voltar?
Quantos beijos lhe darão?
Quantos me faltarão até eu lhe encontrar?

Eu me perco nessas léguas que nos separam,
nessas vontades desiguais.
Eu não me acho sem a sua presença.
E nada me consola nesse meu mundo vazio.

Esse querer absoluto de que você me leve ou venha comigo,
me encolhe em quatros cantos.
Onde está o meu amor?
Onde estou?
Eu que já confessei o amor maior,
que lhe desejei outro amor melhor,
agora volto atrás nessas palavras.
Quem dirá o que será daqui alguns dias?
Essa mente presa de um bicho solto.
Bicho. Presa em ti, presa em ti.

Essa saudade de palavras boas,
essa saudade que mora em meu peito não tem asas,
não voa.
Quem dirá quais são os magos que me trarão seu olhar?
Quem dirá onde moram os alquimistas?
E quem dos alquimistas me dará a fórmula do esquecimento?

Será que convence tornar-me franciscano, barbadinho, gregoriano?
Será que rosa roubada faz enternecer?
Será que comove doar quinto aos desvalidos, e me tomar às causas nobres?
Será que impressiona angariar posses e títulos, me tornar burguês?
Será que enlouquecer ainda é um bom remédio?
Quem dirá se o coração ocupar-se-á de tudo isto?
Quem dirá: quando, onde e porque?
Não sei!

As histórias nas mesas de dados,
se reiniciando,
continuando,
brevemente,
eternamente.
Eis que a tenho: a felicidade.

sábado, 3 de maio de 2008

SAC - Gilberto P Reis


SAC


..........

_ Gostaria de formalizar uma reclamação!

_ Pois sim! Como posso estar ajudando o senhor?

_ É esse coração que comprei. Veio com defeito!

_ E qual é o numero do contrato senhor? Para que eu possa estar encontrando-o no sistema?

_ 2236158/712.

_ Só um momento!... Obrigado por aguardar!

E qual seria este defeito senhor?

_ Mal saí do pós-operatório e o coração apaixonou!

_ E era para ser diferente, senhor?

_ Decerto! Deixei bem claro no ato da compra que queria um coração isento, sem sentimentos.

_ Mas ele já veio com alguma paixão, senhor? Ou se apaixonou por alguém posteriormente?

_ Se apaixonou posteriormente! Na verdade, continuou apaixonado pela mesma pessoa do outro coração. E foi por isso que quis trocar de coração! Entende?

_ Então creio que seja um problema do conjunto senhor!

_ Como problema do conjunto?

_ Sim! Problema dos periféricos! O senhor fez backup e formatou seu cérebro?

_ Não! Achei melhor não, porque tenho algumas boas memórias que gostaria de preservar!

_ Pois então senhor! No contrato que o senhor assinou tem instruções a respeito destes possíveis problemas, caso não siga à risca essas recomendações! O senhor precisaria ter feito o backup dessas memórias referentes à determinada paixão que quisesse deletar, para que não contaminasse o novo coração!

_ Mas ninguém me disse nada a respeito quando contratei os serviços de sua empresa.

_ Como disse ao senhor, essas recomendações estão no contrato senhor! Na pagina 5, parágrafo 6.

_ Mas já é tarde, como faremos agora? Se for para ficar com essa bendita paixão eu prefiro o meu coração antigo mesmo!

_ Infelizmente seu coração foi descartado senhor! Como foi mencionado no contrato!

_ Mas e então minha filha, quero uma solução, posso trocar de coração? Fazer o backup ou formatar meu cérebro agora? Tem que ter um jeito!

_ Infelizmente seu coração está infectado senhor! E não é seguro fazer vários transplantes em curtos espaços de tempo! Formatar seu cérebro não resolveria nada depois do coração transplantado! Não é possível apagar coisas do coração! Se quiser posso transferi-lo para o departamento de vendas e o senhor poderá contratar outro transplante para o futuro, e se seguir todas as instruções, certamente ficará satisfeito com nossos serviços!

_ Olha! Já gastei todas minhas economias nesse transplante! Não tenho aonde tirar dinheiro pra outro!

_ Senhor, temos um serviço de acompanhamento psicológico, o senhor gostaria de estar sendo indicado? Com a ajuda de nossos especialistas poderíamos sanar ao menos um pouco de seus problemas!

_ Moça, psicólogo não resolve! Só outro coração resolve! Vocês sabem disso!

_ Certamente senhor! Mas é o que podemos estar oferecendo para o senhor no momento!

_ Mas não estou certo se isso resolverá algo!

_ Ok! Então posso ajudá-lo em mais alguma coisa?

_ Olha moça! Vou ver o que eu faço e depois ligo novamente!

_ Certo senhor! A clínica Due Core agradece a sua ligação. Boa-noite!

_ Boa-noite!

UM NOVO FINAL DE DIA - Gilberto P Reis

UM NOVO FINAL DE DIA

Verei as estrelas da janela do quarto

Agora que o sol se vai

Eu tenho outras estrelas

Mas espero ver o pôr do sol

Sei que já vi o bastante, mas esse vai ser diferente.

Nada pra discordar

E o sol está livre pra ir.

O que mais posso querer?

Enquanto meus filhos não vêm

E você não me chamar pra casa...

Vou deixar meu mundo mais bonito

Enquanto eu ainda não sou astro

As estrelas nunca acabam

Enquanto você não está

Me levo sozinho ao sol

Só eu nesse céu imenso

Nadando nos ventos

Vendo os carros passarem sem sair do mesmo lugar

E a janela do meu quarto, sempre aberta,

esperando estrela pro jantar.

IMPOÉTICO - Gilberto P Reis

IMPOÉTICO

Meus versos não têm nexo

Meus versos são fracos

Fracos na ligação mas não na intenção

Minha poesia é ruim, talvez não

Eis a razão de não usar-me de Juiz de Fato:

não sou justo comigo mesmo.

Minha poesia é aérea.

Aérea como os sonhos.

As melhores vêm antes.

Quando estou a sucumbir nos braços de Morpheus.

E se perdem no vale cabal.

Juris et de jure, minha poesia é merda

Mas ainda que seja merreca

É o que me acalma.

PRA NAO DORMIR SÓ -Gilberto P Reis

PRA NAO DORMIR SÓ


"FALO-TE"! OUVI.

NAO ME LEMBRO O CONSELHO

PROVAVELMENTE REPUDIANDO UM ERRO.

UM ERRO MEU.

ASSIM ESPERO!

EU VIA O FOGO, ISSO É CERTO.

DISSERAM-ME QUE SERIA BOM PRA MIM, ENTAO EU FUI...

TOQUEI E NAO SENTI

NAO VI BOLHAS EM MINHAS MAOS

NAO GOZEI DOR

NAO ERA FOGO. ERA ILUSAO

E A VOZ ME DISSE: "FALO-TE".

MAS EU VIA O FOGO

NAO SENTIA MAS EU O VIA

QUERIA SENTIR ME APROXIMEI

ME JOGUEI ROLEI SOBRE AS BRASAS

MAS NAO QUEIMEI.

BOM!

BATI A POEIRA DO CORPO, OUÇO A VOZ: "FALEI-TE".

PULEI NO MAR.

SEM TITULO SEM DONO SEM COPYRIGHT (CURRAHEE) -Gilberto P Reis

SEM TITULO SEM DONO SEM COPYRIGHT (CURRAHEE)

ESTAVA PENSANDO QUANTO TEMPO VIVI.

NAO PERDI TEMPO COM CALCULOS DE DIAS,

SEQUER COM HORAS

[MEÇO O TEMPO PELAS CONQUISTAS DERROTAS CONTO DOIS TEMPOS.

... MAS O QUE EU VIVI.

DESCOBRI QUASE NADA PRA CONTAR

PRA QUEM QUEIRA OUVIR.

ATÉ QUANDO VOU FICAR NAO SEI,

MAS QUE IMPORTA?

EU ACHAREI O FIM DESSA ILHA,

E SE ME ACHAR SOZINHO NELA

FINCAREI MINHA BANDEIRA ,

E A TOMAREI COMO CONQUISTA.

O QUE MAIS POSSO FAZER?

EM MEU LUGAR ESTAREI SEMPRE PERDIDO,

“ESPERANDO...”

SOL POENTE - Gilberto P Reis

SOL POENTE

Poderia dispensar apresentações

guardar pra mim todo meu orgulho que dizem ser veneno

falar apenas pra minh´alma o sentido das paixões

mas eu canto a todos os ventos

seus olhos negros como a noite mais fria que recomenda um abraço

abraços que me faltaram um dia me soltaram aos prantos

mensura assim, compasso de corações que esquentam a pele

pele, a pele alva, que fosse negra amarela azul

a lua brilha mansa sobre tua luz

pois a mesma lua enquanto cheia, não preenche meus olhos

pêlos densos adornam o

corpo esguio frágil delicado tão quente quanta força há ali

estou a perder a conclusão desse que não diria um poema por não ser literato

[embora também não considerável literatelho.

mas sim uma confissão uma confusão um devaneio um clamor ...

aqui eu digo:

meus olhos ardem

à eles que confessas toda sua beleza

sei que não é só bela aos meus olhos

não só neles nesse mundo perceberá o brilho

que me caia os destinos

que os meus olhos nunca eclipsem aos seus.

[Do lat. Indulgente.] -Gilberto P Reis

[Do lat. Indulgente.]

Neste te peço minhas sinceras desculpas

E a que mais servem as desculpas

senão pra subornar perdão?

Afinal: não pedirei sinceras desculpas

a um inimigo ou desafeto,

e sim a quem estimo.

À meus amores

mesmo àqueles que a vida não rendeu.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Mundo - Gilberto Reis

Existe um mundo onde os mundos não são mundos.
Aonde eu não sou eu, não sou mundo.

Onde o sol brilha verde, e a grama é então, azul.

Onde você é uma ciclope vesga, calva e rosada.
E eu só não sou mais mundo, mas eu mesmo, igualzinho ao eu desta terra.
E eu ainda te adoro.
Que coisa!

Uma leve brincadeira... - Gilberto P Reis

No meio do caminho tinha uma pedra,
tinha uma pedra no meio no meio do caminho.
Vez ou outra tinha que chutar alguma,
machuca o pé, mas tudo bem.
Sempre tem uma pedra no meio do caminho.
Fazer o que?
É aquela sogra, um chefe preguiçoso, o colega invejoso, o professor malicioso.
E eu também!
Tinha uma pedra no meio do caminho.

Rapaz, não é que achara uma flor no meio do caminho.
Tava no meio de espinhos, acho que deve ser pra se proteger dos passantes.
Mas também tinham pedras.
No meio do caminho tinha uma pedra, mas que tanta pedra tinha nesse caminho!

No meio do caminho tinha uma pedra,
parecia ouro, mas tava com tanta pressa...

quinta-feira, 17 de abril de 2008

INVEROSSÍMIL - Gilberto P Reis

INVEROSSÍMIL

“Inverossímil”
Ela disse.
Mas que mal te fizeram?
Pra julgues assim minha paixão?
Veja só!
“Inverossímil”.
Realmente,
Inverossímil!

Brinquedo de algodão - Gilberto P Reis

BRINQUEDO DE ALGODÃO

Aquela é um ursinho, igualzinho o que papai me deu!
É mesmo!
Desmanchou...
É o vento!

Veja o castelo!
Eu queria poder voar, e moraria naquela!
Você ia querer morar comigo lá?
Eu seria a princesa?
Sim!
Então eu quero!
Mas não vai ter dragão não, né?
Claro que não, e se tiver, eu tchum, mato ele!

As nuvens parecem de algodão!
É lá que moram os anjos, não é?
Eu acho que sim!

Olha aquela! Parece um homem correndo!
Não parece não!

Eu to vendo um elefante! Quero ver se você consegue achar!
É aquela?
É sim, não é bonitinho?
Sim!

Vamos embora!
Espera um pouco!
Por que o céu é azul?
Não sei! Vamos!
Tá acabando as nuvens, você não tá vendo?
Essas nuvens querem nos enganar!

Ou será os anjos brincando de modelar?

Ah! Já está na hora do lanche!
Vamos embora antes que mamãe nos chame!

Solitária - Gilberto P Reis

Solitária

Que linda flor!
Muito bonita...
Que flor é essa?
Não sei!
Tem espinhos!
Não a colha!
Deixe-a aí.
Mas ela está tão sozinha...
Neste campo imenso!
Ora!
E não é que ela sozinha embeleza...
E nenhuma flor fica sozinha por tanto tempo!
Deixe-a aí!
Que é o seu devido lugar!

Oliveira - Gilberto P Reis

Oliveira

Deliro-me herói grego
De saia, espada e lança em punho
Dono de alazão veloz
E dourado velocino
Em guerra contra o mundo
Porque fora o estimado prêmio
Tomado por atroz algoz
Enquanto descansava eu em Olimpo
Durante um sono meu profundo
Abraçado a epístolas em velino
Tecidas por tão olentes mãos
Em noites distantes de meu âmago
Agora sangro meu inimigo
Que por fim tomou-te por corpo
E por alma de mim
E ibidem sangro seus pares
Que mancomunaram tal propósito
A fim desse meu vil fim
Agora sou campeão de lança
Campeão da armada
Da corrida a esmo
Entre campos áridos e olivais
Por tal mal que só guerrear acalma
Essa chaga que brota em meu peito
Sou eu em terras a guerra
Sou eu o que não descansa
Carregando em escudo uma ira
Por ter a minha Helena em leito
Se entregado aos braços de outro
Tornando essa minha coragem
Que ainda em mim estante
Ávido por ti, uma pira.
Proclamo guerra e enfrearei centúria
Destituirei tronos, despearei fúria
Raptarei, subjugarei, dançarei
Findarei campos antigos, amanharei semente
Esta me proverá o ramo de oliveira.

Eu que amo você - Gilberto P Reis

EU QUE AMO VOCÊ

Cansei-me ao fingir ser bem amado,
mas agora sei,
nada mais estou que mal resolvido.
Nenhum dos casos me fez ser quem eu sou.
Sempre me doei, e nem sempre recebi o troco,
mas doação não requer troco, e sim troca.
Mas que fique subentendido.

Me fiz tolo, até idiota já fui,
mas como não encontro a medida certa de amar,
manejarei mal as coisas,
crente que nada será diferente após essa introspecção.

Cansou-me esses amores
confidenciando-me que sou especial,
“diferente de tudo que já haviam visto ou sentido”.
Dessas meias verdades e inteiras cobranças.
Dessas personagens que esperam um príncipe em cavalo branco,
dessas plebéias inexatas e incrédulas.
Que não suportam o não.
Dessas mulheres, que sonham com um lindo loiro de olhos azuis
de metro e oitenta, artista de cinema, rico, e que fale inglês.
De falo infalível.

Ah!
Enquanto eu:
“apenas” eu,
um moreno,
brasileiro,
mineiro,
e que se esforça no português,
levemente regional.
Comum.
Como os demais comuns.

Cansei-me ao brincar
com os sentimentos
nos quais não acredito,
de oferecer o que não possuo,
de precisar de favores
que extinguem a solidão .

Cansei-me de:
amores: fúteis;
sexo: fútil;
carinhos: fúteis;
esperança: fútil;
verdades: fúteis.
Dédalo.

Sim: eu amo.
E a quem importa?
Amor não mais move montanhas,
não forma constelações,
não mais rende verdades,
poesias.
Amor rende manchete policial,
patologias.

Cansou-me a vileza,
de ser vil.
Da mais profunda e sórdida vileza,
que me é reservada por olhos e línguas descrentes.
De espíritos incontentados
que culpam a todos, excetuando -se.
Dos carentes, da carência que me invade.
Do paliativo, de ser cuspido.
Das comparações, das insatisfações.

Cansou-me o esperado,
o planejado,
o sonhado e fantasiado.
Eu quero mesmo é nada,
e esquecer o que parecia ser tudo.

Cansei-me ao ser covarde,
de não encarar verdades,
de fantasiar.
De ser verdadeiro.
A verdade a nada importa,
somente a mim mesmo,
porque, por mais que seja real,
ninguém crerá senão eu mesmo,
então a que vale a verdade?
Esquecerei permanentemente de pedir,
ao longo da vida receberei
apenas o que me convier, nada mais.
Ouvirei,
Atentarei.
E regurgitarei tudo,
em proveniente reclusão.
Pois sei, que mesmo cansado de tudo isso,
ainda será isso o tudo.

Disponho-me veementemente ao egoísmo.
Eu que amo você.
Eu que me amo.
Você que se ame.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Musa Abstrata - Gilberto P Reis

Musa Abstrata

Com apenas um traço lhe desenharam.
Eu vi,
das mãos de um artista de calçada: você.

Quem será essa menina?

Com apenas um traço escrevi teu nome,
...e nunca mais amei ninguém.

segunda-feira, 31 de março de 2008

VÔO 1123. O DIA QUE NÃO ACONTECEU – GILBERTO P REIS

VÔO 1123. O DIA QUE NÃO ACONTECEU

Já estava tudo arrumado desde a véspera, era 05h45min da manhã, mala, as passagens, ida e volta, reservadas. O hotel: cortesia da empresa.
O café fora preparado às pressas, estava mais amargo que de costume, e, a tão apreciada torrada de pão integral besuntada de cream cheese entalou na garganta. Apesar da quebra da rotina, das inúmeras expectativas, da ansiedade, algo não estava “normal”. Estava o dia frio demais para suar as mãos.
A roupa separada sobre a cama. A barba por fazer logo tirada, e nem um pequeno corte fora registrado na face. Estranho! Um banho quente ajudaria a encarar o dia.
Era aquela a primeira viagem aérea, deveria chegar ao aeroporto pelo menos uma hora adiantado, “para evitar contratempos”.
O cabelo não estava bem... Usara então um boné. A cara não estava boa , nada estava bom naquela manhã. A bem da verdade, a roupa caíra bem , nada mais.
Tudo pronto, era hora de sair. O próximo ônibus para o aeroporto sairia às 7:00 horas, e o terminal está apenas a 100 metros do prédio. Um breve check-list do apartamento, para confirmar, sobretudo, as tomadas elétricas desligadas. E se as janelas estavam devidamente fechadas.
Já no elevador, lembrara o cream cheese, desligara a geladeira, “vai estragar”. Ao menos era a única coisa que restara nela. O elevador – geralmente isso acontece quando estamos “em cima da hora” - parou em cada um dos 12 andares antecedentes, o nervosismo tornara aparente, mas enfim saíra a tempo, e após um breve caminhar, adiantara 7 minutos em relação à partida do ônibus. O pensamento voa distante, aproximadamente 500 km. O pulso acelerado. Chegara o dia, finalmente. Tantos planos, tanto tempo, e naquele momento, tudo parecia estar numa tempestade de areia.
A porta do ônibus abre, aguardara então que os demais passageiros entrassem primeiro. O motorista o olhou por alguns segundos, e com aquele silencio, parecia querer desvendar o destino daquele singular passageiro. O cumprimenta, e então fecha a porta, dando partida ao veículo. Deixando para trás um homem sentado no passeio, com sua mala, e um bilhete dançando no ar, sob o efeito da fumaça lançada pela descarga motriz.
Talvez não tenha acontecido desta forma, mas deveria ter sido, já que ninguém notara um assento vazio no vôo 1123.

VAMPIRO - Gilberto P Reis

VAMPIRO

Meus caninos querem beber do teu pescoço
Sob o sol de meio-dia
No ponto mais quente de seu corpo
A camada mais suave de sua pele
Sacie minha sede de você!

INFÂNCIA - Gilberto P Reis

INFÂNCIA

Lembro de quando eu era cedo acordado por mamãe
Eu que nasci cansado, como dizia ela, tinha todo o ânimo da vida para acordar cedo nesses dias.
Era quando ela me literalmente me carregava para a fazenda, um tanto longe, uma légua e meia, talvez. Eu que era menino novo, bastava reclamar os pés doendo e ela me montava cavalinho.
Nos dias de frio, íamos abraçados, aquecendo um ao outro.
E saíamos no fim da madrugada, quando a maioria do mundo ainda não havia acordado, e até mesmo poucos galos.
Por vezes tínhamos a lua para iluminar a estrada, e minha mãe contava estórias da roça, de quando ela era menina e até mesmo de mula-sem-cabeça e saci, o que me metia medo a cada balançar de árvores e piado de coruja.
A lua dava um tom de felicidade àquela face, geralmente serena ou mesmo carranca.
Por anos eu a acompanhei, crescendo fui, então só ia nos dias de férias da escola...

O OLHO QUE NÃO CEGA - Gilberto P Reis

O OLHO QUE NÃO CEGA

Porque tenho eu falar de amor, paz, flores e colinas verdejantes?
Só porque finjo ser poeta?
Não!
Quero e falarei, de guerras, morte e ódio, suicídio e depressão.

E receba este assim mesmo
Curto!
Sem rimas e métrica
Por que já está de bom tamanho.

A/C - Gilberto P Reis

A/C

Aos meus amigos
[inimigos eu não tenho, se os tenho, desconheço, então perigo corro]

Minha família
Meu irmão morto

Aos antigos, aos novos, aos esquecidos
[colegas de trabalho, de escola]

A meu amor – esqueci, não a tenho.

Sou meio esquecido.
Aos meus pecados

DESAMOR - Gilberto P Reis

DESAMOR

Mulher!
Onde encontro esse sentimento?
Que fará com que eu te consuma?
Com que eu não seja egoísta e tão logo venha a cessar?

Mulher!
Onde está essa essência em mim que não aflora,
mas que tanto exala em ti?

Mulher! Não peça mais para que me deite.
Não sofra!

ALICE - Gilberto P Reis

ALICE

Faça de conta que eu sou eu.
[E você continue sendo você mesma.]
Faça de conta que me abraça
Faça de conta que está feliz
No país das maravilhas, dos burros falantes
Faça de conta que você não tem rei e a justiça emana

Faça de conta que é muito natural
E que descansam os homens

Faça de conta que o amanhã virá diferente.

QUE TAL? - Gilberto P Reis

QUE TAL?

Eu,
Você,
Ao meu lado sem segredos
Falo-te tudo sobre mim
E ainda o que não fiz
Façamos do tempo a alegria
E algum momento pra chorar
Pois é preciso cicatriz

Falaremos sobre estrelas
Ecologia futebol
Sobre o amor
Meus amores
Sobre musica sobre esta talvez

E que tenha não medo por seus erros
Juntos sempre há jeito de consertar

Falaremos sobre tudo que te possa interessar
Faculdade camisinha
Carnaval hipocrisia
Sobre a minha timidez

Ou um mesmo assunto várias vezes sem ao menos nos cansar
E de cara eu direi: te amo.
Só pra começar

Vamos ver TV, falar de mim, de você
E quem sabe...
Do cinza, da rosa e por que não? De blues...

Carnaval de amargura - Gilberto P Reis

Carnaval de amargura

Sou Pierrot e choro por sina
Choro pela Colombina
O arlequim que é mais graça te roubou
Me deixou assim desiludido de mim
Perdido sem os olhos da colombina
Sozinho fugindo da multidão
Pois toda colombina só quer amor depois da festa
Depois que abusou no prazer e ressaqueou na desilusão.
Mas também, arlequim é cantor, é ator, é jogador, é lírico, é caçador, é rico, e tem uma ilha em seu nome.
Conhece o mundo como a palma da mão e tem loqüela .
Arlequim já foi pirata, astronauta, cowboy, marinheiro, herói.
Colombina é sonhadora, sentimental, de dentes alvos, olhos diamante e lábios carmim.
E eu Pierrot nato, o que será de mim?
Me fale Colombina, como seria se não existisse arlequim?

FALANDO DA MORTE - Gilberto P Reis

FALANDO DA MORTE

Viver é bom
Morrer é bom também

E digam:
-- Vire essa boca pra lá!
Ai se me censuram!

Mas vejam só:
Vivo sou poesia
Morto sou lembrança
Que diferença faz?

É bom viver enquanto está vivo
Depois que morre morto está e nem percebe
Nem reclama
Então...

Morrer em copula
Em cama
Morrer sentado no sofá
São mortes boas, sabia?

Mortes doentes são ruins
Ataque cardíaco nem se fala
Morrer de barriga vazia faminto
Mas depois que morre é uma maravilha
Dá vontade de morrer de novo

Eu que não tenho pressa
Senão morria hoje mesmo
Mas como venenos pecam pela pressa
Espero, e que não morra do pior modo
Pois só se morre uma vez não é mesmo?
E não quero desagradar de minha morte.

Mas acho melhor não morrer hoje mesmo
Marquei compromisso pra noite com a Tereza
E se falto ela me mata.

Despedida na estação de trem - Gilberto P Reis

Despedida na estação de trem

Me abrace
Me beije
Me olhe
Me pegue e apegue
Me leia
Me rasgue
Me carregue
Me leve
Me guarde
Me aguarde
Mas nunca me esqueça no guarda-volumes.

Eu... - Gilberto P Reis

Eu...

Não sou herói nem de mim mesmo
Mas já fui anjo de alguém
Sei que há mais valor no que não se tem
Enquanto isso a vida passa,
a que me permite
Transmite luz

A luz do sol me cega
Não me deixa saber
Quem serei eu

Amanhã!

Acordo cedo sem pressa
Não há nada mais pra se fazer
Pois o sol já está lá
E eu não consigo ver

E a manhã vem de surpresa
Com suas surpresas
Porque enquanto durmo as coisas acontecem.

ONDE ESTÃO AS PALAVRAS? - Gilberto P Reis

ONDE ESTÃO AS PALAVRAS?

Ainda estou esperando a palavra
Ela não veio
Uma verdade ficará oculta
Pois a palavra não veio
E sem palavra verdade não há

Mas é certo que cem palavras seriam mentiras
Mas sem uma palavra
Nenhuma palra é confiável

Mas minha reminiscência é falha...

AMANHA DA SIGNA - Gilberto P Reis

AMANHA DA SIGNA

A terra acolhe o jardim
Que acolhe a flor.
A flor acolhe o inseto
Que colhe o néctar
E acolhe o pólen.

O inseto distribui gametas.
A mão colhe a flor.

O vaso acolhe a água.
A água do vaso acolhe a flor
Que a mão colheu.
O nariz acolhe o sabor
O olor.

A flor acolhe o nariz
Colhe felicidade
E murcha.

TODA SAUDADE É UMA ESPÉCIE DE VELHICE - Gilberto P Reis

TODA SAUDADE É UMA ESPÉCIE DE VELHICE

O nascido já nasce morrendo
[senão natimorto.
Pois cada dia passado
É um dia a menos
E pelo fim esperado.

Sendo a vida simples
Passa rápido como corisco
Cada dia de esperança.

Cada dia é passado.
O passado de hoje é agora
De agora será amanhã.
O de amanhã já é esquecimento.

E como presente e futuro não existem
[o presente é ilusão.
Volvemos ao passado.
Passa-culpas é a vida.
Somos passatempo.

Passacale já não mais toca
Não tocam no nefasto passado
Não tocam no inciso fechado.

E como finda minha cota
De suspiros e aspirações
Pois passado ajunto muito.
Que conservem os brasões.

MESA PARA DOIS - Gilberto P Reis

MESA PARA DOIS

Como-te a carne quente suada salgada
No bafo do forno febril encerrado
Iguaria em óleos essenciais
Denunciando a gulodice o pecado.

Cozinho-te em olhos ferventes
E sinto sua carne vermelha ardente
O rubor o sabor o repasto.
Rega-bofe fausto.

Derrubo-te o molho cálido
E enrolo-me em ti. Uma massa.
Molho e massa, malha e mosso.

Bebo-te o vinho dos lábios
Que escorre os seios o corpo o copo
Sugo-te o néctar o suco a alma
Cheiro o sabor da pele curtida
Em licor de mangaba.

Como-te o doce dos olhos
Do melindroso corpo formosa
A língua molhada cremosa
Que escorre cicio e calda.

Dance Baco dance!

ARFAR... - Gilberto P Reis

ARFAR...

Inspiraaaar... Expiraaaaar...
Inspiraaaar... Expiraaaaar...
Aaaaaaaarrr...
Arfaaaarrrrr...

Vida! Unnn...fuuuu...
Unnn...fuuuu... unnn...fuuuu…
Ssssss...fuuuuuuuu...

Aspiraaaaar… vida.

Suuffooooco. Aaaarrrrr…
Brônquios! Aaaarrrr…Vida arfante.

Noite de profunda insônia - Gilberto P Reis

Noite de profunda insônia

Quem nunca sentiu o corpo expandir
A ponto de parecer explodir
ao acalanto da boca macia
fundida ao corpo rígido
língua e verso verbo fálico

Corpo corpo... fundido
Dissolvido
Voltvai num amor lúcido
Entrelaçado intumescido

Mulher voluptuosa
Levará o meu verso minha língua
[Enquanto gustarás meu órgio.
Ao ponto lúbrico pequenino desse corpo
E que não me negues pois sou seu rei.

Beijo boca céu estrelas em quarto escuro
Boca vulva boca
Seios coxa bunda mamilos rosa-cravo
Mel de favo carnoso seda pura

Virgem minha experiente dama
Que me abriga em colo macio
Que meu corpo inflama
Me resguardando do mundo pelejado
Em teus pertuitos perfumados e febris

Já em fogo que não fere mas aquece alma
No acme do prazer a colher o fruto
e receber as glórias, o sumo, em borbotões e espasmos
Me consome e me deixa esgotado flácido

Não se cora devido o corpo nu e caminha
[com graça no quarto lúdico.
E esvai-se a culpa do olhar pois é mágica
[e pura, divina essa carne.
Já não me perturbam as formas, é plácida.
Descanso. Renasço.

A VOCÊ, COMPARADO AOS OUTROS QUE DEVIA TER FEITO - Gilberto P Reis

A VOCÊ, COMPARADO AOS OUTROS QUE DEVIA TER FEITO.

Te desejo todo o amor do mundo
Que possa desfrutar
A paz verdadeira
que insisto em te dar

Enquanto isso vai continuando
Em buscas...
Do verbo amar
Mesmo sabendo que é tão fugaz
Aquele mesmo! Que não me podes conjugar

A vingança do amor. Dói! Ardor!
Rendo-me travesso, infante vassalagem.
Mesmo que sofra que me ultrajem
Continuo
Consola-me este horror, esta tristeza: tua felicidade.

Oh Grande! Oh penoso Amigo-fantasma!
Que divide comigo frustração.
Tão logo as crianças não venham pra levar tudo ao chão
Permaneço um bárbaro sagaz em meu pensamento.
Tu que entende de toda sorte de coisas, um dia irá entender...

TENDA DAS INCERTEZAS - Gilberto P Reis

TENDA DAS INCERTEZAS

No circo de todo mundo eu fui
O palhaço comediou e riu de mim
Eu chorei.

[Certas coisas não se encontram em quitandas. Venenos sim. Mas venenos decifram os crimes.

Na 3ª margem do rio eu esperei
A chegada da criatura feliz
Eu sorri.

A roda partiu-se ao meio
A galé afundou levando meus desafetos
Gloriei batalha
Dormi.

Platônico - Gilberto P Reis

PLATÔNICO

Olho apenas vejo
Você não me conhece

De pé e te sonho
Você não me conhece

Desejo o seu desejo
Você não me conhece

Tento-me a ti mostrar
Você não me conhece

Não desisto nem conquisto
Você não me conhece

É perfeito, não dana,
Nem percebo quando acaba
Você não me conhece

Velei-te em sono febril
Em noite fria.
Ainda assim você não me conhece.

Transe - Gilberto P Reis

TRANSE

Eu não careço de tantas coisas que achei que carecia.
E eu não obtive nem a metade das coisas que ansiei.
Não vivo mais escravo do desejo, dos sonhos.
A que perdi minha conquista?
Na poeira dos sonhos nebulosos se fuera.

Derramando como deserto entre os dedos,
caindo pesado como cometas kamikazes,
sangrando o chão onde piso.

Queimando toda a vida que havia ao meu redor,
meus olhos não brilham mais,
olhos em preto e branco,
não choram.

Mas queimam, estalam.

TABIQUE - Gilberto P Reis

TABIQUE

Não te amo como se fosses rosa de sal,
topázio ou seta de cravos que propagam o fogo:
amo-te como se amam certas coisas escusas,
secretamente, entre a sombra e a alma.
Amo-te como a planta que não floriu
e tem dentro de si, escondida,
a luz das flores e,
graças ao esse amor,
vive obscuro em meu corpo
o denso aroma que subiu da terra.Amo-te sem saber como, nem quando, nem onde, amo-te amiúde.Amo-te diretamente
sem problemas nem orgulho:
amo-te assim porque não sei amar de outra maneira, a não ser deste modo
em que nem eu sou nem tu és,
tão perto que a tua mão no meu peito é minha,
tão perto que os meus olhos se fecham com seu sono.

Moça - Gilberto P Reis

Moça

Cabelos... Vento do inverno assobia no assombro da escuridão
Negros cabelos brilham, brilham meus olhos para a solidão
a noiva não veio, se veio não a vi, insalutífera distração
sempre foi assim nas noites de São João.

Louco como eu só
e que por ti que não desata o nó
como que eternamente num caaigapó
eu esteja opresso aguardando tornar-me pó.

Disponho me de luvas para apanhar guloseimas
guardo sob pesadas mantas meus pulsos e teimas
para que a freima que me toma não falte as maneiras
exultando meus desejos contra as regras costumeiras.

Me recolho acabrunhado
Pés-de-moleque provisionados na algibeira
guardar o sabor do domingo p´ra segunda-feira.

Carta - Gilberto P Reis

CARTA

Aos meu amigos
inimigos eu não tenho
- se os tenho desconheço
desconhecendo, perigo corro -.
À minha família
Ao meu irmão morto
aos antigos
aos novos
esquecidos
colegas: do lavoro, das lições.
À vizinhança desconhecida.
Mentário.

Ode à morte - Gilberto P Reis

Ode à morte

Meu irmão morreu
Meu cão morreu
Minha mãe vive
Graças!

Meu pai morreu
Alguém sentiu faltas
Não fui eu decerto.
Se quiser, chores!

Meus avôs morreram
Amigos morreram
Aos muitos poucos.
Eu fiquei.

Como sempre fico
Nostálgico, apático.
O amor morreu
Como sempre.

O poeta morreu
Não enterraram sua poética.
Os poetas morreram
E ninguém pra reclamar. Imito.

E eu...vivo.
Alguns dias muito vivo.
Muitos dias vivo.
E outros poucos morto, vivo.
E tem dias que preferem morrer.

SAUDOSISMO - Gilberto P Reis

SAUDOSISMO

Como é bom te ver
E não ver sua tristeza.
Gostaria que tivesse encontrado
um amor valente,
Constituído família,
tido filhos.

Eu lutaria uma guerra.
Desde que fosse guerra
Homérida,
e não de armas químicas
e mosquetes.

Já que não o fez.
Já que não o fiz.
Hoje eu morreria por você,
e não pediria nada em troca.

Casamata - Gilberto P Reis

CASAMATA

Hoje me descobriram
Me despiram
Hoje me fiz um nada
senti a labéu do homem

Tanto mais minha ingenuidade
Que com a força da insegurança
Me permite a boa mentira.
Boa? Para quem?
Hoje, em minha cova em folga de sepultureiro
Aguardo.

Frutos secos - Gilberto P Reis

FRUTOS SECOS

Veja o sangue em minhas mãos
Fruto de o meu fazer
Eu que sempre temi as armas
Eu que sempre amei a vida
Armei a morte.

Ficarão órfãos os cães
Morrerá todo o jardim.

Polissemia Urbana - Gilberto P Reis

Polissemia Urbana

Belos quartos
Corro a quadra
Perco a senhoria e a dona.

Vão... Depositei no banco
O meu suor, meu cansaço.
Descansei.
E ao meu lado: Praça. Memorial. Praça.

Na escola, crianças, cola.
Na escola, crianças, ficam.

A fonte secou!
Só não secou a lembrança.
Concreto. Alto. Auto.
Vidro. Vidro. Reflexo. Reflito.
Faixas. Atento ao Coletivo! Passe.

Pé-de-pau. Paraíba.
Estou na Pindaíba.
Na minha frente pára mascate.
- Saia! Sem renda... Presente pra moça sorrir
- E também eu, acá vários dias, mas precisando de meio pra partir.

- Sou moço sem moça, moço.
- Pena! Ou levaria a leva...

Boteco se torna Botica
Matando minha sede
Curando minha dor.
Não é doença... Solução...

Belos quartos
Corro a quadra
Perco a senhoria e a dona.

Vão... Depositei no banco
O meu suor, meu cansaço.
Descansei.
E ao meu lado: Praça. Memorial. Praça.

Na escola, crianças, cola.
Na escola, crianças, ficam.

A fonte secou!
Só não secou a lembrança.
Concreto. Alto. Auto.
Vidro. Vidro. Reflexo. Reflito.
Faixas. Atento ao Coletivo! Passe.

Pé-de-pau. Paraíba.
Estou na Pindaíba.
Na minha frente pára mascate.
- Saia! Sem renda... Presente pra moça sorrir
- E também eu, acá vários dias, mas precisando de meio pra partir.

- Sou moço sem moça, moço.
- Pena! Ou levaria a leva...

Boteco se torna Botica
Matando minha sede
Curando minha dor.
Não é doença... Solução...

Suplício de Tântalo - Gilberto P Reis

SUPLÍCIO DE TÂNTALO

Na intenção apenas,
E não no trato das regras,
Me valho mais para o parnaso
Na construção de meus verbos.
Mais porque se trata de um real
Sentimento.

Mas é veneno sem dor
Remédio que não cura
Comédia infeliz.
Sem risos sem romances sem lágrimas
É que a moça não é de outrora.
Não provinciana... É contemporânea...
Não se abisma com sentimentalismos.
Romântico já não mais sou.

Obstante, me vou.
Estúrdio como sou.
Não pra´qui, não pra´lá.
Caminhando precipícios.
No extremo dos meus dias.

sábado, 22 de março de 2008

Poemas, poesias e prosas e...


O gato – Gilberto P Reis

Boa-noite! Digo ao espelho
Vem a hora do descanso
A tinta secou
A pena gastou
E sendo assim os sonhos não voam mais

O papel branco na mesa
Revela onde estou
Os meus desejos carnais

Sabe-se que Marias e Marias
Partem e vão nem sempre sós
Há sempre outros Joãos
João que me tomou Maria
Me presenteou a solidão
E não é por Maria
Por que Maria tem muita
É por causa do gato

O felino que me esquentava os pés
Aos pés da escrivaninha
De madeira compensada
O bicho não era meu
Era de Maria
Tanto que nem lembro o nome do bicho
Assim como Maria não se chama Maria
E quem a levou não se chama João
Mas o gato foi levado e
Era branco como o papel sobre a escrivaninha.

Papel
Que limpa a boca gordurosa
Que orna sanitários
Que aceita obscenidades
Que suga água e óleo
Que seca os dedos glutões
Sempre branco
O branco merece o sujo

Era estranho e belo
Maria acariciando o gato
Carregava pra lá e cá
Amava o bicho
Me odiou no final
Eu não tinha ciúmes do gato
Entende?

Maria era gentil
Com o gato com João
Comigo não
Mas eu tinha pena
Papel, tinta, ...e gato
A raiva de Maria era que no papel branco
Eu escrevia Maria rainha eu era rei
No papel branco.

CAMAFEU – Gilberto P Reis

CAMAFEU – Gilberto P Reis

A grande pedra que carrego estava sob meu passo
E guardei em meu bolso
Enrolada em papel de sonhos gravados com caneta esferográfica
Em noite insônifera
E tende-me a tombar de lado pelo bolso cansado.

Carrego a pedra pra peso de papel
Para o papel de sonhos
Sonhos são ironias que ainda não aconteceram
Que aguardo como um camafeu.

Minha morte é ironia.
Ironia não dar meu nome ao seu filho que não é meu
Não dançar valsa em bodas de vossa senhoria
Velar-me sem seu desespero de viúva precoce.
Quão insano estou

E eu canto

Recanto pra afogar memórias
Maltratá-las como maltrata os ciúmes
Crime meu do mundo do criador do mundo.
E mensuro a pedra e parto em duas
Pra equilibrar meus lados enquanto caminho
[em chão pavimentado.
Em minha casa, solitário, servirão de peso de papel
E pesará meu sonho.

Sem copyright

LEI PARA TODOS OS HOMENS – Gilberto P Reis

LEI PARA TODOS OS HOMENS – Gilberto P Reis

Cada rua que eu subo e desço; mensurável.
Como que cada dia andasse mais pelo mesmo caminho.
O caminho se torna maior e fatigoso.
O mesmo imensurável.

Ou eu não percebo possível causa; menso.
Causa incógnita de ser; mensual.
E por caminhar o mesmo caminho.
Afim de sustentar; mens legis.

Mênstruo; para matérias pertinentes
Que ao acaso possa me ser valente.
Visto esses dias fatigantes.

Mentado; serei por pouco e poucos.
Em lápide barata sobre terra intumescida
Denunciando cova pobre.
Tumeficado; Já estou há muito...

CONTA O PONTO... – Gilberto P Reis

CONTA O PONTO... – Gilberto P Reis

[Todos querem...
Partindo do princípio de qualquer conto
Em que todo ponto marca o fim
-E que o fim é o começo-
De qualquer história
Mas não marca pontos necessários
Para que haja encontros
Enquanto se perdem e perdem Tickets de desconto.
Bilhetes de cinema para historiar calmantes
Sobre o começo da vida e o fim do amor
Das lições e missões sucedidas e das relações marginais
Fim de mês e do sal contas muitas e do colar
Que contava a historia da avó e avô
E agora pagam as contas do penhor
Sendo o penhasco remédio de um comprimido só
Muitas vezes já curou a dor
De alguns de muitas histórias que o livro
Ocultou nas páginas em branco, e arrancadas
Para fazer calor.
E eu não sei seu conto
Por acaso ias...?
... Contar.]

TINHOSA – Gilberto P Reis

TINHOSA – Gilberto P Reis

Que queres tu?
Senão desgraçar-me a razão
Tornar-me um bêbado em dias de novena
Profanar o púlpito de minh’alma?

Que fazes tu?
Senão condenar-me ao lânguido martírio.
Caminhar-me ao lodo viscoso
Por puro prazer profano.

Que pensas tu?
Que deixarei cair-me em desgraças?
E ser levado ao dorso de Argali?
Engana-se, sou anixo,
mas virtuoso às escusas.

Então bruxa mandingueira,
minha´alma não carregas.
Menos meu coração.
Menos meu perdão.

terça-feira, 4 de março de 2008

[Do lat. Amore] - Gilberto P Reis

[Do lat. amore.]

Amor: abstrato substantivo.
Mas vamos ao que me interessa. Tanto falei, tanto ouvi , e ainda não sei o que é realmente. Então presumo assim, como presumem os filósofos e astrólogos: amor é uma empada de camarão e coca-cola.
Fulana é uma senhora, usarei do termo assim mesmo, que sofre de velhice. Vive há 83 anos. Fora um exemplo de amor incondicional de mãe, fora. Hoje quase não anda, e imotivada, quase não sai da cama, pouco fala. E sofrendo dos malefícios – ou por que não belezas – da velhice, não ama mais seu filho, este mesmo que abdicou de sua vida para cuidar do que resta da dela. E ela: não o ama mais, simplesmente porque não se lembra quem ele é. Ele não é seu filho, vez e outra a previnem para o contrário (mas é esforço desnecessário, sem valia). Não ama a mais sequer seus três cachorros, devido suas faculdades mentais. Não, não ama a mais ninguém.
Mas não é este o assunto.

(Nenhum amor é eterno. Confiem.)
Amor à primeira vista. 1. Amor súbito, ao primeiro encontro.

Amor carnal. 1. O que busca a satisfação sexual; amor físico.

Amor físico. 1. Amor carnal.

Amor livre. 1. O que repudia a consagração religiosa ou legal, representada pelo casamento.

Amor platônico. 1. Ligação amorosa sem aproximação sexual.

De mil amores. 1. Bras. De todo o gosto; com o maior prazer; com prazer.

Fazer amor. 1. Ter relações sexuais; copular.

Pelo amor de Deus. 1. Por caridade; por compaixão.

Por amor à arte. 1. Desinteressadamente, gratuitamente.

Um amor. Fam. 1. Pessoa ou coisa muito linda; um amoreco, um sonho, uma graça, um encanto, uma coisa, um doce, um doce-de-coco, um negócio, um troço, uma uva.

Amor é uma empada de camarão e coca-cola, alguns minutos de prazer, fugaz. O amor é fugaz.
Acaba quando a beleza acaba, quando o tesão acaba, quando o tempo demora acabar.
Amor com tempo torna-se costume, não há como negar. E o permanecer, a resignação, são justificados pelo medo, pela insegurança. Pior sem amor, muito pior com o nada.

Mas volto à empada de camarão e coca-cola.

Isso é amor que conheço, amor de verdade, curto, mas real, concreto. Úmido e quente, refrescante e gaseificado. Para o gozo da língua, do corpo, do ego. O gosto.
Mas logo; deglutido, digerido e absorvido; o amor é consumido, acaba. E acionada a descarga sanitária – decerto não era aquilo o que eu amara – se esvai, e vai, sem remorsos, o amor.
Custo total do amor: R$ 3,50 na Irmãos Empada.

Domingo no shopping - Gilberto P Reis

Domingo no shopping - Gilberto P Reis

_ Venha ver este modelo!
_ ...
_ E então, não gostou?
_ Você viu aquela TV de quarenta e duas polegadas? Tá na promoção!
_ Viemos comprar estofados, e compraremos estofados!

Ela já não suportava mais olhar aquela velharia prostrada no meio da sala, herança de sua sogra. Nem convidava suas amigas devido à vergonha. Convencera o marido a trocar o sofá após semanas de insistência, é para ele relíquia de família, ela opinara por doá-lo para a caridade, jogar fora. Mas o marido consultou um antiquário, e é incrível como algo tão soez desperte o interesse de algumas pessoas, e elas pagam caro por isso, que levassem de graça, mas não precisaria usar da poupança para custear o novo jogo de estofados. Não pensou duas vezes, tanto que o espaço na sala está desocupado há três dias, esperando pela coragem do marido, já que a poltrona ficara, assim como a TV de 29 polegadas.

_ Gostei deste branco! Camurça, não é?
_ Dá muito trabalho para limpar, e também teríamos que trocar toda a sala para combinar. Principalmente sua poltrona velha!
_...

Ele é alheio a quase tudo, não discute, apenas ouve, e por vezes passam semanas e só ouvindo, por fim faz as vontades dela, não desiste mesmo. Mas a poltrona fica, e agora que o Timão subiu pra série A do brasileirão... Ah! Aquela TV de 42... Ela que escolha o sofá, ela é quem sempre escolhe mesmo.

_ Pronto! Será este modelo azul! É lindo!

Comprar um sofá é muito mais simples quando se é solteiro. Quando não é fanático pelo Timão. Azul lá em casa não entra. Assina o cheque e conclui a compra. E enquanto a mulher vai namorar o refrigerador duplex com “dispenser” de gelo na porta...

_ Mande entregar um modelo preto!

Acata o vendedor, com um sorriso sádico, e com a comissão que lhe faltava para comprar aquela TV de 42 polegadas.